Qual a validade de um contrato assinado por aplicativos de mensagem?
Contratos firmados por WhatsApp são válidos? Entenda os requisitos legais, decisões dos tribunais, riscos jurídicos e cuidados necessários na contratação por mensagens.
Raul Dias | Advogado
12/17/20254 min read
Com a modernização dos meios de comunicação, aumentaram as oportunidades de negociação entre indivíduos e empresas. Em certa época, essas ocasiões limitavam-se aos ambientes presenciais ou às cartas [1]. Posteriormente, surgiram o telefone e o e-mail e, com eles, os contratos firmados por essas vias. Hoje, com aplicativos de mensagens rápidas e meios fidedignos de assinatura digital, a amplitude dos meios de contratação é ainda maior, pois contratos podem, sim, ser firmados por WhatsApp ou canais semelhantes. Impõem-se, portanto, cuidados para os agentes, em especial diante da maior informalidade nesses canais.
Nada impede que um contrato seja firmado por WhatsApp, Telegram, Signal ou afins. A validade do negócio jurídico — do que o contrato é uma espécie — depende, nos termos do art. 104 do Código Civil de 2002, de forma prescrita ou não defesa em lei, além dos outros requisitos. Ou seja, em regra, a forma de contratação é livre, podendo ou não ser reduzida à escrito pelas partes, desde que a lei não o exija. Enviado o texto, “assim que o emitente da mensagem não tem mais controle sobre esta e não mais pode revê-la eletronicamente, sua vontade está manifestada” e, portanto, a proposta ou aceite está dado, nos termos da teoria da expedição [2].
O Tribunal de Justiça de São Paulo e o Tribunal de Justiça de Minas Gerais reconhecem validade para contratos firmados por essa via. Há acórdão do TJMG validando a celebração de acordo de renegociação bancária por essa via, no qual se afirma que “os contratos possuem, em regra, forma livre, e se aperfeiçoam apenas com o consentimento entre as partes” [3]. Já do TJSP referenciamos três casos em que se compreendeu que a apresentação de propostas por mensagem vincula o proponente, em conformidade com o art. 428, caput, I a IV, do Código Civil de 2002 [4]. Em relação ao tempo de celebração do contrato, este relativizou seu entendimento com a possibilidade de que o prazo de resposta seja avaliado in casu, mesmo que seja tido como contrato entre presentes.
O envio de mensagens em âmbito negocial demanda cuidado. Regras que em geral são cuidadosamente consideradas em ambientes formais — como a caracterização de uma aceitação com alterações ou restrições como uma nova oferta, abrindo espaço para uma negativa da contraparte — podem ser esquecidas nesses aplicativos. Por outro lado, um contrato firmado somente por mensagem poderá ser questionado judicialmente por uma parte insatisfeita, em especial acerca da integridade da prova — e que mesmo se consagrando vencedor, há custos judiciais e de oportunidade que podem surgir daí.
Além disso, a existência do contrato difere de sua executividade. O Tribunal de Justiça de São Paulo já reconheceu, conforme o art. 784 do Código de Processo Civil de 2015, que contratos verbais com negociações por WhatsApp não constituem título executivo extrajudicial [5]. Para que isso ocorra, o contrato deve seguir as regras do CPC, contendo assinatura eletrônica, dispensada as duas testemunhas quando a integridade for conferida por provedor de assinatura. Mensagens de WhatsApp constituem prova escrita suficiente somente para a propositura de ação monitória — o que já é melhor do que uma ação de cobrança [6].
Justamente por ser mais informal, portanto, a negociação e a contratação por WhatsApp exigem maior cuidado da parte. O assessoramento por um advogado é fundamental para evitar perdas na celebração do contrato e constituir da maneira devida as provas para proteger o contratante futuramente. As facilidades da tecnologia não devem ser causa de aumento de risco jurídico para o agente responsável.
NOTAS E REFERÊNCIAS
[1] Essa realidade ainda influencia grandemente nossa legislação, haja vista as disposições sobre contratos entre ausentes.
[2] MARTINS, Fran. Contratos e obrigações comerciais. 18. ed., rev., atual. e ampl. por Gustavo Saad Diniz. Rio de Janeiro: Forense, 2018; COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito comercial, v. 3. 13. ed. São Paulo, Saraiva, 2012. p. 62.
[3] TJMG. Apelação Cível n. 1.0000.16.052870-9/003, Comarca de Belo Horizonte. Relator: Des. Ramom Tácio. Julgamento em 2 maio 2018. Publicação em 3 maio 2018. Belo Horizonte: TJMG, 2018.
[4] TJSP; Apelação Cível 1019154-29.2020.8.26.0602; Relator (a): Tasso Duarte de Melo; Órgão Julgador: 12ª Câmara de Direito Privado; Foro de Sorocaba - 1ª Vara Cível; Data do Julgamento: 27/01/2022; Data de Registro: 27/01/2022; TJSP; Apelação Cível 1015476-17.2017.8.26.0309; Relator (a): Michel Chakur Farah; Órgão Julgador: 27ª Câmara de Direito Privado; Foro de Jundiaí - 1ª Vara Cível; Data do Julgamento: 31/08/2023; Data de Registro: 31/08/2023; TJSP; Apelação Cível 1016239-86.2022.8.26.0068; Relator (a): Mendes Pereira; Órgão Julgador: 15ª Câmara de Direito Privado; Foro de Barueri - 2ª Vara Cível; Data do Julgamento: 28/08/2023; Data de Registro: 28/08/2023
[5] TJSP. Apelação Cível 1014207-85.2017.8.26.0003; Relator (a): Cristina Zucchi; Órgão Julgador: 34ª Câmara de Direito Privado; Foro Regional III - Jabaquara - 3ª Vara Cível; Data do Julgamento: 19/07/2018; Data de Registro: 19/07/2018; TJSP. Apelação Cível 1126540-38.2021.8.26.0100; Relator (a): Lígia Araújo Bisogni; Órgão Julgador: 34ª Câmara de Direito Privado; Foro Central Cível - 2ª Vara Cível; Data do Julgamento: 01/08/2022; Data de Registro: 05/08/2022
[6] TJSP; Apelação Cível 1000243-58.2025.8.26.0063; Relator (a): Paulo Toledo; Órgão Julgador: Núcleo de Justiça 4.0 em Segundo Grau – Turma III (Direito Privado 3); Foro de Barra Bonita - 2ª Vara; Data do Julgamento: 21/10/2025; Data de Registro: 21/10/2025; TJSP; Apelação Cível 1003813-57.2024.8.26.0299; Relator (a): Rosangela Telles; Órgão Julgador: 31ª Câmara de Direito Privado; Foro de Jandira - 1ª Vara; Data do Julgamento: 10/10/2025; Data de Registro: 10/10/2025.
